Tocantins e Acre são destaques no mercado de créditos de carbono

Os mercados do Tocantins e Acre, hoje já em operação, englobam todo o território do estado, inclusive propriedades privadas e territórios de povos indígenas e comunidades tradicionais.

No modelo tocantinense, por exemplo, o governo mediu a variação do desmatamento de 2016 a 2020 em relação aos cinco anos anteriores de cada ano em todo o território e contabilizou que o estado gerou 40 milhões de créditos de carbono.

O governo fechou um acordo com a suíça Mercuria, empresa do setor de energia. Por meio dele, a companhia dará R$ 40 milhões ao estado para a validação e registro dos créditos.

Após esse processo, a empresa comprará, a preço de mercado, todos os créditos já gerados, além daqueles que podem ser desenvolvidos até 2030, quando o Brasil espera zerar o desmatamento. O governo não divulgou estimativas de arrecadação.

De acordo com o governo do Tocantins, 50% do total arrecadado será direcionado para ações de estruturação, monitoramento, controle e reorganização dos órgãos ambientais. Outros 20% irão para povos originários e tradicionais; 20%, para o agronegócio; e 10%, para unidades de conservação.

Os valores serão revertidos em políticas públicas e não chegarão diretamente à conta de nenhum proprietário rural. A expectativa do governo é que os recursos sejam suficientes para reverter o atual aumento na taxa de desmatamento do estado.

Já o Acre repassou 100 milhões de créditos de carbono para uma empresa (a CDSA) controlada por ele, mas que em sua estrutura societária também tem parte, por exemplo, a federação de indústrias local.

Em janeiro, uma reunião da diretoria da CDSA determinou que os 100 milhões de créditos fossem cedidos para uma companhia dos Estados Unidos, chamada Global Environmental Asset Plataform, que passou a ter o direito de vendê-las. O processo não teve licitação e a companhia estadunidense só foi abrir sua sede no Brasil em março.

Pelo acordo, a empresa do governo acreano fica apenas com um percentual de cerca de 10% do valor pelo qual a Global conseguir vender os créditos.

Por avançar sobre terras privadas, os mercados jurisdicionais dificultam a operação de desenvolvedoras privadas de crédito de carbono, e é justamente esse ponto que dificulta a tramitação do PL na Câmara.

Proprietários rurais, por exemplo, já vêm desenvolvendo projetos privados de crédito de carbono no país. Apesar de mais caros, esses projetos podem gerar retornos muitos maiores e individuais.

“Em um projeto privado, um proprietário de terra negocia com o desenvolvedor quanto ele vai receber dos créditos. Uma comunidade indígena que quiser desenvolver projetos de forma privada também vai negociar. Nos mercados jurisdicionais não tem tanta essa flexibilidade”, diz Jeronimo Roveda, secretário-geral da Aliança Brasil NBS, organização que reúne as principais empresas do mercado voluntário de carbono do país.

Os estados que já têm mercados jurisdicionais não impedem a existência de projetos privados, mas obriga que seus desenvolvedores os comuniquem ao governo, responsável por analisar a metodologia utilizada.

“Todo aquele projeto que porventura for desenvolvido no estado do Tocantins e não atender a lei é ilegal”, disse à Folha o secretário estadual de Meio Ambiente, Marcelo Lelis. Esse ponto, aliás, preocupa o governo federal, responsável por fazer as análises de metodologia dos créditos do mercado regulado.

O manifesto divulgado na semana passada pelos governadores descarta que o mercado jurisdicional afetaria o desenvolvimento de projetos privados.

Lelis afirma que projetos privados ligados ao mercado jurisdicional —ou seja, analisados pelo governo— chegam a valer três vezes mais no mercado voluntário. Os desenvolvedores não refutam essa estimativa.

Luciano Godoy, advogado e professor da FGV Direito SP, projeta que pode haver um “conflito de competências administrativas”, com uma série de mercados conflitantes, que inclusive deve acabar no STF (Supremo Tribunal Federal).

“Ninguém pode vender a mesma coisa duas vezes, porque o crédito de carbono é um só. Ainda mais nesse caso, é expresso que vai ter litígio no STF, porque envolve a União e estados”, afirmou.

Ele entende que os casos nos quais a lei prevê que o estado é detentor do crédito até de propriedades privadas é um ponto que também deve acabar no Supremo.

Na sua visão, a corte deve entender que isso fere o artigo 5º da Constituição, e que o crédito deve ser considerado dentro do direito de propriedade —ou seja, deve ser do titular da propriedade.

“Se o STF não reconhecer dessa forma, como parte do direito de propriedade, então provavelmente ele vai dizer que o estado vai ter de pagar o crédito do qual ele está se apropriando do proprietário do imóvel. Como uma obra pública, na qual o estado tem de desapropriar o terreno”, disse.

 

Com informações da Folha

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