No Coração do Brasil, a Doce Teimosia do Amor
A geografia da música brasileira é feita de movimentos sísmicos. Ondas que nascem no litoral, sobem o sertão, explodem nas capitais e, por vezes, retornam às suas origens, mansas e nostálgicas. É nesse refluxo, nessa maré de sentimento, que encontro uma banda de nome quase ingênuo, mas de uma força tremenda: Forró Doce Encanto, direto de Araguaína, Tocantins.
Ouvir o som que eles produzem é como abrir uma cápsula do tempo. Não o tempo distante do baião de Gonzagão, mas um passado recente, que ainda pulsa na memória afetiva de milhões. Estamos falando daquele forró eletrônico, de paixões avassaladoras e letras cortantes, que tomou o país de assalto nos anos 90 e 2000. A banda não esconde suas fontes: Calcinha Preta, Limão com Mel, Caviar com Rapadura são mais que influências, são o DNA, a certidão de nascimento do seu som.
Em tempos de piseiro, de batidas sintéticas que miram o algoritmo do TikTok, a aposta do Doce Encanto é na contramão. É uma aposta na melodia que gruda, no refrão que se canta a plenos pulmões, na sanfona que chora junto com a guitarra. Canções como “Proibido Amor” e “Lágrimas Derramadas” não pedem licença. Elas arrombam a porta da memória, trazendo de volta o cheiro do salão de dança, o gosto do primeiro beijo, a dor da primeira perda.
O que me encanta aqui não é a busca pelo novo, mas a coragem de aperfeiçoar o que já era bom. É a teimosia de dizer que o romantismo não morreu, apenas estava esperando a trilha sonora certa para voltar a dançar de rosto colado. As cinco faixas autorais que eles já lançaram são um manifesto. Um recado de que, no coração do Brasil, onde o asfalto encontra a poeira, ainda há espaço para se perder “nessa estrada”, para remoer “lembranças” e para admitir um “erro” por amor.
O sucesso que já fazem no Tocantins e que agora se espalha como vento quente pelo Pará e Maranhão não é um acaso. É a resposta de um público que, talvez cansado de amores líquidos e relações fugazes, anseia por algo que permaneça. Algo que tenha a doçura e o encanto prometidos no nome da banda.
O Forró Doce Encanto não está reinventando a roda. Eles estão apenas a lubrificando com sentimento, polindo-a com arranjos caprichados e colocando-a para girar no palco, onde a mágica realmente acontece. E, no fim das contas, não é disso que a música popular é feita? De nos fazer sentir, de novo e de novo, como se fosse a primeira vez.
Vida longa a eles.

